Crítica de Adão Negro (2022)
O filme do anti-herói da DC Comics é uma promessa para o futuro do DCEU
A DC Comics sempre estabeleceu que seus heróis estão acima da humanidade, são deuses entre nós. Desde a fase de ouro dos quadrinhos, até os traços mais realistas do Alex Ross, passando ainda pela representação cinematográfica de heróis como o Superman (1978), que fazem a terra girar ao contrário para salvar a mulher que ama.
Repletos de grandiosidade, benevolência, espírito altruísta e isentos de falhas (ainda que esse ponto seja questionável), colocar um ser humano no mesmo patamar de um Deus é uma tarefa complexa – e gera situações toscas como a luta entre o Superman, a Mulher-Maravilha e o Apocalipse, em Batman v Superman: A Origem da Justiça (2016), onde o Batman, desprovido de superpoderes, precisa se esconder da ameaça alienígena.
O contrário, porém, também é algo igualmente estranho. Com o sucesso de Batman: O Cavaleiro das Trevas, filme do diretor Christopher Nolan, lançado em 2008, que era uma história mais “sombria e realista”, condizente com o Homem Morcego, a Warner Bros., influenciada pelo lançamento do Universo Cinematográfico Marvel, decidiu adotar esse padrão e criar seu próprio universo de heróis.
Esse universo expandido da DC Comics (DCEU), iniciado em 2013 com O Homem de Aço, estrelado por Henry Cavill, foi produzido de maneira acelerada e desordenada, não tendo o sucesso esperado pelo estúdio, tanto de crítica quanto de audiência. Coordenado pela mente do diretor Zack Snyder, o tom realista não combinou com a essência dos heróis.
Quase dez anos depois, e após o lançamento de onze filmes, chega às telonas mais um novo capítulo do DCEU, dessa vez protagonizado por Dwayne Johnson, o The Rock, abraçando essa proposta de divindades entre os humanos, vista em Mulher-Maravilha (2017).
Adão Negro (2022) conta a história de um anti-herói que, ao longo de sua vida, se viu na condição de escravo nas terras de Kahndaq, um país árabe. Destinado a uma vida de tormento, o protagonista recebe poderes dos magos Shazam para ser “O Escolhido”, aquele com a missão de proteger o povo de Kahndaq. Contudo, ele começa a usar os seus poderes com propósitos egoístas, sendo aprisionado até a atualidade, quando consegue, enfim, se libertar.
O retorno do Adão Negro é visto com bons olhos pelo povo de Kahndaq, uma vez que ele age, ainda que sem essa motivação explícita, na defesa dos interesses do país, como um verdadeiro protetor (mesmo que, para isso, ele precise matar todos que estiverem em seu caminho). Porém, Amanda Waller (Viola Davis), responsável pelo departamento de meta-humanos, quer contê-lo a qualquer custo, já que ele pode representar uma ameaça para a humanidade.
Para impedir que o Adão Negro provoque mais mortes, Amanda entra em contato com uma equipe de heróis, a Sociedade da Justiça da América (JSA), que na formação do filme, é composta pelo Senhor Destino (Pierce Brosnan), Esmaga Átomo (Noah Centineo), Ciclone (Quintessa Swindell) e liderada pelo Gavião Negro (Aldis Hodge). Juntos, eles vão até Kahndaq para prender o protagonista.
A história do filme gira em torno do núcleo familiar constituído em torno de Adrianna (Sarah Shahi) e Amon (Bodhi Sabongui), mãe e filho, que fazem o protagonista enfrentar seus dilemas morais para mantê-los salvos.
Os conceitos morais do filme são levantados o tempo todo, afinal de contas, essa é a história de um anti-herói. A definição de certo e errado, de condutas aceitáveis, da postura que um herói deve ter diante da sociedade fazem parte dos questionamentos que o longa aborda, levando o espectador a se questionar até que ponto certas atitudes podem ser permitidas.
O extermínio de um grupo miliciano é válido para libertar uma nação? Eles deveriam ser julgados por suas ações, cumprindo a pena que lhes for designada? Todas essas questões são levantadas em prol da ambiguidade moral do protagonista – ou seria uma simples confusão de propostas narrativas?
Nos quadrinhos, o Adão Negro é, inquestionavelmente, um vilão da DC Comics, rivalizando com o Shazam, em função da origem similar dos poderes de ambos os personagens. Aqui, ao traçar essa linha narrativa da ambiguidade, fica explícita a intenção da Warner em utilizar a figura do seu grande astro, Dwayne Johnson, para vender o filme (e mantê-lo ao longo de anos nesse universo).
A atuação do astro é, sem sombra de dúvidas, o ponto alto da trama. The Rock consegue dar vida ao personagem que sempre esteve como vilão do Shazam, acrescentando camadas de personalidade para a história do, agora, anti-herói da DC Comics.
Em uma clara mudança de tom presente desde Liga da Justiça (2017), o humor se faz presente no longa, com personagens dedicados ao alívio cômico e de relevância narrativa. O Esmaga Átomo do Noah Centineo é um herói que ainda não compreende a grandiosidade dos seus poderes, uma vez que acabou de “adquiri-los”.
Sempre com um lanche nas mãos, o personagem coloca em prática a máxima “se não puder ajudar, atrapalhe, pois o importante é participar”, rendendo boas doses de risos, em completa oposição à outra tentativa cômica do longa, Karim (Mohammed Amer), irmão de Adrianna.
Estruturalmente, a história se apoia em um macguffin, que é um elemento de suma importância para os personagens da trama, mas sem qualquer relevância para a audiência. Aqui, esse objeto é uma coroa, cuja posse pode conferir poderes e habilidades místicas, sendo o grande desejo do vilão da história, que quer se tornar o rei de Kahndaq.
Adão Negro é um filme de herói que se propõe a ser, justamente o que um filme do gênero precisa ser para fazer sucesso: embates entre heróis (ou anti-heróis), grandes conflitos morais, sequências de ação e humor para quebrar a tensão em momentos impactantes. Peca, contudo, em não saber se quer abraçar a história de um vilão ou de um herói.
Se a DC Comics está aprendendo com os próprios erros, Adão Negro é um passo na direção certa, mostrando que o futuro pode ser brilhante, desde que a proposta não seja tão mirabolante.
FICHA TÉCNICA
Adão Negro
Título Original: Black Adam
Duração: 124 min (2 h e 4 min)
Direção: Jaume Collet-Serra
Estrelado por: Dwayne Johnson, Sarah Shahi, Pierce Brosnan, Noah Centineo, Aldis Hodge e outros.
Estreia Nacional: 20 de outubro de 2022
Nota: 7/10
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